Conhecido por seu olhar visionário, Hideo Kojima não economizou nas críticas à indústria de games em uma entrevista rara concedida à revista Ssense. Para o criador de Metal Gear, o cenário atual está mergulhado em uma crise criativa com jogos que se repetem à exaustão, estúdios que operam como fábricas sem alma e uma indústria que, segundo ele, perdeu o brilho… e perdeu Kojima como jogador.
“Monstros alienígenas, monstros medievais… e só”
Kojima revela que seu desânimo começa onde deveria existir empolgação: nos grandes eventos de games. Ao comentar sobre vitrines como o Summer Game Fest, ele critica a falta de diversidade. Segundo ele, os títulos apresentados giram sempre em torno das mesmas fórmulas: alienígenas, espadas medievais e sistemas de jogo quase idênticos.
“Até os visuais e os sistemas são praticamente iguais”, afirma. Para o desenvolvedor, o que era para ser um palco de ideias originais se tornou apenas mais um ciclo promocional previsível e extremamente lucrativo, mas criativamente falido.
AAA: o alto custo da mediocridade
O problema, segundo Kojima, está no modelo de produção. Ele aponta que os grandes títulos estão caros demais, inchados demais e arriscados de menos. Estúdios encerram atividades porque o sistema se mostra insustentável, e a inovação é sacrificada em nome da previsibilidade.
“É uma espiral descendente que ninguém parece disposto a interromper.”
-dispara.
Sem citar nomes, Kojima menciona ter se sentido “profundamente decepcionado” com um jogo recente de ação furtiva feito por um estúdio renomado. Mas sua crítica não para por aí:
“Eles fazem jogos militares, mas talvez nunca tenham segurado uma arma na vida. Eu aprendi a desmontar e disparar de verdade.”
Para Kojima, falta autenticidade — e isso, para ele, é um sintoma grave da indústria AAA atual.
Indies são o farol, mas para poucos
Se a inovação ainda pulsa, ela vive em outro lugar: os estúdios independentes. “É lá que as coisas interessantes estão acontecendo”, diz Kojima. O problema? Nem sempre essas ideias encontram visibilidade ou público. Ele confessa que joga cada vez menos.
“A indústria me perdeu como consumidor.”
-afirma, num tom quase melancólico.
Kojima deixa claro que não está bancando o elitista. Ele compreende que muitos jogadores buscam exatamente o que está sendo produzido. Mas seu objetivo é outro: desafiar, surpreender, romper padrões. E é por isso que ele não pretende sequer encostar no remake de Metal Gear Solid 3, produzido pela Konami. Para ele, evoluir é deixar ir, não repetir o passado.
O grito de um artista — e o alerta de um veterano
A crítica de Kojima não soa como uma explosão impulsiva. Vem de alguém que dedicou décadas a um setor que, um dia, ousava ser vanguarda. Hoje, ele vê esse mesmo setor refém de modelos de negócios que incentivam o design mais genérico possível.
A pergunta que ele levanta é inevitável: será que a indústria vai perceber esse ciclo de estagnação antes de afundar de vez?
Enquanto isso, Kojima segue em sua própria jornada criativa. Atualmente, trabalha no projeto de terror OD e em possíveis desdobramentos do universo de Death Stranding. Ainda inquieto. Ainda desafiando as regras. E, por isso mesmo, ainda essencial.