Após cinco anos de espera, a Sucker Punch retorna às telas com Ghost of Yōtei, uma nova jornada que leva o jogador às terras geladas e isoladas de Ezo. Se em Ghost of Tsushima acompanhamos a glória e o sacrifício de Jin Sakai, aqui mergulhamos em uma história muito mais sombria e introspectiva. É uma experiência que abandona o heroísmo para se concentrar na dor, na perda e nas cicatrizes que a vingança deixa na alma.
Desde os primeiros minutos, senti que estava diante de algo familiar, mas diferente. Yōtei não quer apenas ser uma sequência espiritual, ele quer revisitar o conceito do “fantasma” sob uma nova luz. A protagonista, Atsu, uma ronin marcada pela tragédia, parte em uma caçada sangrenta contra os lendários Seis de Yōtei, responsáveis pela destruição de sua família. O jogo se passa em 1603, em uma versão ficcional da região de Hokkaido, chamada Ezo, e desde o início estabelece um tom mais frio, melancólico e humano.
O peso da vingança
Se Tsushima foi sobre honra e sacrifício, Yōtei é sobre culpa e redenção. A história de Atsu não tem espaço para glória, apenas para consequências. O roteiro é direto, sem firulas, mas cumpre o que promete: me manteve emocionalmente engajado, mesmo sem entregar uma narrativa que vá marcar gerações. Há momentos intensos e outros mais contidos, mas o jogo encontra força justamente na simplicidade e isso funciona. Durante a campanha, encontrei missões secundárias com o mesmo peso emocional das principais. Algumas terminavam em poucos minutos, outras se desdobravam em arcos mais longos.

Essa variação de ritmo me agradou: Yōtei sabe quando ser conciso e quando se alongar. Há recompensas imediatas, mas também momentos de introspecção que reforçam o vínculo com a protagonista e o mundo ao redor. Um detalhe interessante é o uso de flashbacks interativos, acessados ao deslizar o dedo no touchpad do DualSense. Nessas sequências, Atsu revisita lembranças do passado e o jogador compreende melhor sua dor e motivações. É uma mecânica sutil, mas poderosa, e mostra o quanto a Sucker Punch entende o equilíbrio entre narrativa e imersão.
Combate: precisão, brutalidade e ritmo
O sistema de combate é uma das maiores evoluções da Sucker Punch. O estúdio manteve a essência da “dança do samurai” que tornou Tsushima tão marcante, mas ampliou as possibilidades. Aqui não existem mais posturas fixas da katana, em vez disso, o jogo introduz diferentes armas, cada uma mais eficaz contra tipos específicos de inimigos. A mudança exige adaptação constante e traz uma sensação de improviso que torna os confrontos mais dinâmicos e imprevisíveis. As armas de fogo, novidade neste universo, aparecem de forma pontual, mas bem integrada. Elas acrescentam camadas estratégicas às lutas sem transformar o jogo em um “shooter”.


Outro destaque é a mecânica de pegar armas do chão, algo que lembra Assassin’s Creed Valhalla, mas com uma execução mais refinada. Esse detalhe reforça o realismo e o senso de urgência, em Yōtei, sobreviver é se adaptar. A inteligência artificial dos inimigos foi aprimorada, reagindo de forma mais orgânica a barulhos e padrões de ataque. Mas o que realmente brilha aqui é o sistema de dificuldade personalizada. É possível ajustar agressividade, furtividade, dano e resistência conforme seu estilo. Eu testei várias combinações e encontrei um equilíbrio perfeito entre desafio e fluidez. Essa liberdade faz com que cada jogador tenha uma experiência verdadeiramente sua, algo que deveria ser padrão em jogos de ação.
Durante a minha jogatina, comecei no modo com Ray Tracing para apreciar os visuais, mas acabei migrando para o modo desempenho a 60 FPS. A diferença foi notável: as batalhas ganharam ritmo, precisão e impacto. Cada golpe parecia mais vivo, mais responsivo e, sinceramente, impossível voltar atrás depois disso.
Mundo e exploração: liberdade real
Uma das maiores surpresas foi o novo sistema de exploração. Apesar de manter uma estrutura em capítulos, Yōtei oferece liberdade genuína na escolha das missões e dos alvos principais. É possível decidir quem eliminar primeiro, dentro de certos limites narrativos. Essa abordagem lembra Assassin’s Creed Shadows, mas com a assinatura da Sucker Punch, um equilíbrio entre roteiro guiado e mundo aberto orgânico. Durante minha jornada, percebi como o mundo de Yōtei é vivo. Os desafios secundários, os puzzles, as atividades como o corte de bambu e os santuários retornam, mas todos com um toque de refinamento. É fácil se perder por horas apenas explorando, porque o mapa te convida a “vagar sem pressa”. Essa sensação de descoberta é comparável à de Breath of the Wild e Elden Ring: aquela curiosidade genuína que te faz esquecer o objetivo principal.


Entre as atividades mais envolventes estão as tocas de lobos, onde Atsu liberta animais aprisionados e ganha pontos de habilidade específicos. Com o tempo, é possível até invocar um lobo companheiro em combate, um toque simbólico e emocional, que reforça o tema de conexão e sobrevivência em meio à solidão. O sistema de recompensas também é um destaque. São 31 alvos que podem ser caçados em qualquer ordem parcial, reforçando o tema da vingança pessoal. Caçar cada um deles garante dinheiro, recursos e armas únicas, o que estimula a exploração.
Um espetáculo visual e sonoro
Graficamente, Ghost of Yōtei é um salto notável em relação ao antecessor. A Sucker Punch manteve a direção de arte cinematográfica como essência, mas agora mistura estilos: há um equilíbrio entre o realismo e a estilização. O jogo não busca o fotorrealismo absoluto e sim a beleza da imperfeição. As áreas principais são de tirar o fôlego, com uso magistral de luz e partículas. O contraste entre a neve branca, o sangue e o dourado dos templos cria uma estética poderosa e memorável. É verdade que algumas áreas secundárias sofrem com texturas mais simples, especialmente em locais menos visitados. Ainda assim, o impacto visual é impressionante.


No PS5 padrão, o desempenho é exemplar, os carregamentos são praticamente inexistentes, mostrando o poder do SSD ao alternar entre áreas e flashbacks quase instantaneamente. A trilha sonora merece destaque absoluto. Misturando tambores, shamisen e corais etéreos, ela acompanha cada confronto e momento de exploração com precisão emocional. A dublagem em português está impecável. A atriz Beatriz Villa (a mesma voz de Freya em God of War Ragnarök) entrega uma performance intensa e contida, que eleva o peso dramático de Atsu.
DualSense, modo foto e novas mecânicas
O DualSense é um espetáculo à parte. Os gatilhos adaptáveis e o feedback tátil são usados de maneira criativa: sentir o peso da espada, a tensão do arco e o toque sutil ao deslizar o dedo no touchpad para pintar paisagens são experiências imersivas e únicas. Essa conexão física entre jogador e jogo reforça a imersão que só a Sucker Punch parece dominar com tanta sensibilidade. O modo foto recebeu aprimoramentos sutis, mas eficazes. É mais intuitivo, com novos filtros e ângulos dinâmicos, um prato cheio para quem gosta de capturar a beleza do Japão feudal.
O sistema de acampamentos também foi destaque: agora é possível cozinhar, obter buffs temporários e interagir com NPCs itinerantes. Em alguns casos, até comerciantes e aliados aparecem de surpresa, transformando esses momentos em pequenas pausas de aconchego no meio da brutalidade da jornada. O sistema de forja complementa esse ciclo, permitindo aprimorar armas em minigames simples, mas satisfatórios. Não chega à complexidade de Kingdom Come: Deliverance 2, mas funciona bem e mantém o ritmo do jogo.




Já o sistema de progressão abandona a tradicional árvore de habilidades e adota um formato mais espiritual. Ao fazer orações em santuários, o jogador recebe bênçãos que fortalecem áreas específicas. Essa escolha conecta narrativa e gameplay de maneira elegante, reforçando o equilíbrio entre vingança e redenção que permeia toda a história. E entre as pausas de sangue e gelo, há espaço até para leveza. O minigame de moedas, uma espécie de duelo de precisão, é uma dessas surpresas que quebram a tensão e recompensam a atenção aos detalhes.
Nosso agradecimento à PlayStation Brasil pelo fornecimento da chave de review de Ghost of Yōtei. Esse acesso antecipado foi essencial para a realização da análise completa disponível em nosso site.
Veredito
Ghost of Yōtei é tudo o que um sucessor espiritual deveria ser: respeita suas origens, mas tem coragem de ir além. A Sucker Punch amadureceu sua fórmula, entregando um jogo mais denso, introspectivo e técnico. Ainda que a narrativa não alcance o impacto emocional de Tsushima, ela cumpre o que se propõe e faz isso com autenticidade. A ambientação é impecável, o combate é viciante e o mundo é um convite constante à exploração. Mesmo com pequenas falhas gráficas e alguns momentos de irregularidade no ritmo, Yōtei é um dos títulos mais marcantes do PS5 até agora, um jogo obrigatório para quem amou Tsushima e quer sentir novamente aquela mistura de honra, dor e beleza.