A continuação que amplia os limites entre jogo e experiência sensorial
Se Hellblade: Senua’s Sacrifice já havia deixado marcas profundas ao unir narrativa e emoção, Senua’s Saga: Hellblade II chega como uma evolução dessa proposta, com novos recursos técnicos que elevam a imersão a outro patamar. Joguei no PS5 base, a 60 FPS, e a sensação foi de estar diante de uma obra que, mesmo carregando algumas limitações do passado, se reinventa pela força visual e pela intensidade emocional.
Mais uma vez, não se trata apenas de jogar… mas de caminhar ao lado de Senua, enfrentando suas dores e medos enquanto o mundo ao redor se desfaz entre realidade e delírio.

Um espetáculo visual e sonoro
O salto gráfico é o primeiro impacto. As paisagens da Islândia viking são deslumbrantes: costas devastadas pela chuva, vales verdejantes cortados por rios e cachoeiras. Cada detalhe parece vivo, e confesso que passei longos minutos apenas explorando o modo foto, tentando capturar a força desses cenários.
Mesmo no modo desempenho, com 60 FPS, quase não senti perda de qualidade em relação ao modo resolução. Luzes, reflexos e partículas mantêm sua força, mostrando o trabalho técnico impressionante da Ninja Theory. A performance fluida ajuda a sustentar o ritmo sem sacrificar a atmosfera.
No áudio, o jogo mostra sua verdadeira arma. As vozes que ecoam na mente de Senua não apenas guiam, mas atormentam, sussurrando dúvidas, certezas e contradições. A experiência com fones continua essencial, e a combinação de dublagem e captura de movimentos eleva cada expressão facial a um nível de realismo raro.

Uma narrativa sombria e envolvente
Senua agora segue em uma jornada contra traficantes de escravos islandeses, mas o enredo vai muito além de vingança ou sobrevivência. A história se constrói em camadas, misturando mitologia, sofrimento humano e o peso da psicose da protagonista.
É uma trama que não grita para ser compreendida; pede paciência, contemplação e entrega. Mais do que inimigos ou batalhas, são os silêncios, os rostos esculpidos em pedras e as árvores que guardam segredos que conduzem o jogador. A jornada continua íntima, desconfortável e profundamente humana. Não há reviravoltas pirotécnicas, apenas uma cadência de descobertas que mistura culpa, luto e mitologia. Gostei de como o jogo evita clichês: cada batida narrativa adiciona contexto e peso, e a mente de Senua segue como uma lente rachada por onde vemos tudo. É uma narrativa que pede entrega e silêncio, não pressa.
Gameplay entre tensão e repetição
Assim como no primeiro jogo, o combate permanece simples: golpes básicos, defesa, esquiva e contra-ataque. A variedade é limitada, mas há um refinamento que tornou os confrontos menos monótonos. A sensação é de ritmo e tensão, mais do que de espetáculo.
Os quebra-cabeças seguem como metáforas visuais da mente fragmentada de Senua. Embora alguns tragam boas ideias, outros soam repetitivos ou excessivamente vagos, quebrando a fluidez emocional.

O Modo Desafio da Podridão Negra encaixa-se com perfeição na fantasia cruel do jogo. A cada morte, a podridão sobe pelo braço de Senua e, se você insistir no erro, perde o progresso. É um risco-recompensa à altura da série. Por outro lado, amarrar o troféu de platina à conclusão desse modo torna a platina menos sobre domínio da experiência principal e mais sobre tolerância à punição.
Um detalhe, no entanto, me incomodou: a vibração exagerada do DualSense ao interagir com totens ou árvores. Em vez de intensificar a imersão, acabou me afastando dela. Ainda assim, são momentos pequenos frente à força da experiência como um todo. A jornada com Senua continua intensa e memorável, e esses pequenos incômodos apenas reforçam que o jogo não é perfeito — mas também não precisa ser. Cada escolha visual, sonora e narrativa se soma para criar uma experiência que desafia, emociona e permanece com o jogador mesmo depois que a tela escurece.

Veredito
Senua’s Saga: Hellblade II é uma experiência sensorial madura, que escolhe o desconforto como linguagem e encontra na técnica um aliado, não um enfeite. É mais bonito e envolvente que o primeiro, sem abandonar as limitações de variedade e progressão. Para quem aceita a proposta contemplativa e angustiante, a jornada recompensa com momentos de rara potência.
Imperfeito e essencial, com um coração artístico que bate alto o suficiente para sobrepor as falhas mecânicas.